Projecto


"Olhares Escondidos" é um projecto de matriz social que incide sobre as crianças do Instituto Português de Oncologia, Serviço de Pediatria. Este projecto pretende dar ênfase a valores sociais como igualdade e cooperação e mostrar a importância das actividades de Animação Sociocultural no tratamento destas crianças e no seu processo de socialização. Este projecto realizar-se-á no dia 30 de Maio de 2008, terá lugar no espaço Lions do Instituto Português de Oncologia e é da responsabilidade dos alunos do 3º ano do curso de Animação Sociocultural.

Como o próprio nome indica "Olhares Escondidos" remete-nos para uma realidade sofrida, em que os olhares das crianças se mostram tristes.

"Mais importante que saber qual o tipo de doença que a pessoa sofre, é conhecer essa pessoa que sofre essa doença" (Hipócrates)


segunda-feira, 2 de junho de 2008

Agradecimentos

Gostariamos de expressar o nosso agradecimento e reconhecimento a todas as educadoras que se mostraram sempre disponiveis para nos ajudar, mas principalmente à Educadora Rosário pelo carinho com que sempre nos recebeu, pela ajuda prestada e pela amizade. É uma senhora com um coração enorme. Um exemplo de alegria e profissionalismo. E gostariamos, também, de dar uma palavra de reconhecimento ao nosso Professor e Doutor Avelino Bento, pelo acompanhamento prestado durante todo o semestre preparando-nos para a realização deste projecto. Pela atenção que sempre nos dedicou, pela opinião sincera que sempre nos deu, pela sua disponibilidade e amizade e por tudo o que nos ensinou.
A todos o nosso sincero obrigado.

Avaliação

Quer se considere a Animação Sociocultural uma práctica ou um fenómeno sociocultural, um conjunto de acções, uma técnica ou um instrumento de trabalho social e/ou cultural, um modo de intervenção, uma metodologia, uma tecnologia ou método de intervenção, é possível isolar alguns elementos comuns quanto àquilo que está em jogo, ou seja, numa linguagem popular, "as linhas com que se cose a Animação Sociocultural": a participação, a comunicação entre pessoas, grupos, comunidade; a transformação sociocultural, mas o respeito pela tradição; a melhoria na qualidade de vida; a consciencialização, a integração social, o desenvolvimento pessoal e grupal, a dinamização e a democratização cultural, social e educativa.
A Animação Sociocultural constitui, como resposta a problemas concretos e delimitados, um sector e uma modalidade de intervenção cada vez mais consolidada, enquanto estratégia de actuação "no terreno" assente numa estrutura básica de procedimento. Esta estrutura de procedimento não pode ser entendida como uma sequência rígida de etapas, mas como uma linha operativa "pensada" de forma sistémica, em que se considere a investigação adaptada à dinâmica das diferentes realidades socioculturais.
O animador é um indutor de desenvolvimento e um agente de mudança, que tenta adequar os seus métodos e técnicas em função do local no qual vai trabalhar.
Quando escolhemos o IPO de Lisboa, serviço de pediatria, para a realização do projecto, sabiamos à partida que teriamos de ter um cuidado especial devido aos problemas que as crianças enfrentavam e à dificuldade que poderiamos sentir na interacção com elas. Mas nunca pensamos em desistir, até porque só se aprende fazendo e esta experiência era muito importante para o crescimento de cada um de nós. Independentemente de correr bem ou mal, o principal foi a aprendizagem que cada um conseguiu retirar, para que num futuro próximo nos possamos servir dos conhecimentos adquiridos. Desta forma, no dia da realização do projecto, fomos munidos de todo o tipo de actividades para que pudessemos dar resposta à exigência, não só das crianças, mas também dos seus familiares.
O projecto "olhares escondidos" teve uma boa aceitação por parte das crianças e dos seus familiares, normalmente, a criança doente faz-se acompanhar não só da mãe e do pai como, por vezes, dos irmãos, avós ou outros familiares.
É relevante dizer que os pais sentiam tanta ou mais necessidade de brincar, participar, rir e ter alguns momentos de descontracção, o que foi importante, visto que as crianças no inicio sentiram-se um pouco hesitantes com a nossa presença, simplesmente, porque apesar de já nos conhecerem das outras visitas ao hospital, ainda não existia cumplicidade suficiente. Os pais acabaram por estabelecer uma "ponte" entre nós e as crianças. A partir desse momento começou a existir um sentimento de entreajuda e cooperação. As crianças participaram em todas as actividades juntamente com os familiares. A Animação também serviu como forma de terapia.
O Projecto consistiu na criação de ateliers, aos quais atribuimos o nome de cantinhos. Tais como: o cantinho "Criar para Levar", onde eram construidos brinquedos para levar, como bolas, joaninhas, bonecos feitos com balões, chapéus, coroas entre outros; o cantinho da "Pintura", onde todos aqueles que queriam, punham tinta nas mãos e deixavam a sua marca nos painéis e o cantinho "Escolha Livre", aqui era dada a liberdade de escolha, as crianças e todos os participantes podiam fazer outras actividades para além da pintura e da construção de brinquedos, como a pintura de desenhos, recortes, colagens e bricolages variadas, isto porque temos a obrigação de deixar as crianças escolherem o que querem fazer. Não podemos exigir a estas que façam, até porque não é esse o objectivo, mas sim fazer com que elas se sintam bem na realização e concretização das actividades, a opinião delas e o seu interesse é o mais importante. Bem basta a doença que não foi uma opção.
A actividade que as crianças mais gostaram, como é natural, foi da construção de brinquedos, porque os podiam levar para casa.
Com a concretização deste projecto sentimos que tinhamos dado o melhor de nós, aprendemos muito com as crianças, estas são verdadeiramenta impressionantes e inteligentes. Ficamos comovidos quando estas nos perguntavam: tão aqui amanhã? Olha eu tou cá amanhã e para a semana também. Podem cá vir? Estas perguntas fazem-nos sentir, humildemente, valorizados.
Conseguimos, desta forma, atingir todos os objectivos a que nos tinhamos proposto.
Para reflectir....
"Assim como a necessidade de curar ou de ser curado não criou a necessidade de ser médico,
não será a necessidade de desenvolver as relações sociais a criar a profissão de Animador.
Os médicos e os progressos da medicina criaram a necessidade de curar, como os animadores e os progressos das suas técnicas, criarão talvez uma necessidade de Animação."
(POUJOL, Geneviéve, 1978)

Actividade Lúdica

Na aborgagem da problemática da hospitalização da criança, é necessário ter em conta as suas necessidades globais. Tal implica a adopção de medidas ao nível dos espaços e equipamentos, onde se incluem os materiais de brincar e jogar mas também implica que se tenha presente as necessidades de cada criança e que se atenda às suas reacções perante as diferentes situações.
Quando uma criança dá entrada num hospital, seja numa sala de espera, numa sala de exames ou de tratamento, esta deve encontrar um espaço lúdico, com brinquedos, jogos, livros, pessoal capacitado que se preocupe em amenizar o contacto da criança com o hospital e que compreenda as necessidades das mesmas.
As actividades lúdicas, o brincar, o jogar têm o "poder" de tornar o ambiente de um hospital mais leve, distendido e alegre. Os brinquedos, os jogos e as actividades realizadas no local devem ter em conta todas as idades e ser de livre acesso e escolha, a criança não pode ser obrigada a fazer o que quer que seja, o profissional tem de ter a capacidade de reacção para dar resposta e estas situações. É importante que existam espaços abertos onde a criança possa brincar de livre e espontânea vontade, espaços que lhe sejam acessíveis, quer ela vá pelo seu próprio pé, numa cadeira de rodas ou na cama.
Brincar no hospital é tão importante como tomar a medicação ou fazer os exames clínicos. A existência de bonecos, balões de soro, seringas, roupas para fantasiar (médico, enfermeira) permitirão também à equipa poder preparar a criança através da brincadeira, mostrando-lhe o que vai acontecer durante a sua estadia no hospital e quais as diferentes intervenções a que será sujeita. Se estiverem presentes estas dinâmicas, a criança e o jovem poderão exprimir a sua angústia, dor e agressividade ao brincar e jogar. Enquanto observadores, os profissionais devem ajudá-los explicando as situações com que estes têm dificuldade em lidar.
Há que ter em conta alguns aspectos importantes no acto de brincar:
  • O acto lúdico deve responder às questões que se colocam à criança durante as diferentes fases do internamento;
  • É necessário manter a auto estima da criança e dar-lhe apenas materiais que ela possa manipular com sucesso. Nestas idades, as crianças não toleram o insucesso de uma brincadeira numa situação que já lhes é difícil (internamento);
  • Há que dar a possibilidade à criança de brincar sozinha, com companheiros ou com os pais, conforme a sua vontade;
  • Toda a criança deficiente ou acamada deve participar em todas as brincadeiras em que os seus companheiros participarem;
  • Há que ter presente que a observação das brincadeiras é uma fonte importante para completar a informação clínica;
  • Os actos lúdicos devem contribuir para a preparação e recuperação da criança, antes e após as intervenções cirúrgicas e outros procedimentos traumáticos.

Como sabemos na maioria dos serviços pediátricos existem educadores de infância, é do senso comum que, existindo estes profissionais, lhes deverá caber a tarefa de acompanhar, desenvolver ou estimular a presença do direito de brincar no hospital e também de entreter as crianças e jovens nas horas livres de que dispõem quando não estão em tratamento, mas é necessário ver para além do óbvio. Consideremos que este trabalho deve ser encarado como mais uma "valência" na pediatria e que deve ser da responsabilidade de uma equipa multidisciplinar, onde vários saberes e experiências se encontram, como parte integrante de toda a equipa do hospital. Torna-se necessário encarar a brincadeira, os brinquedos, os jogos e as actividades como fundamentais para a melhoria nas condições da estadia da criança, do adolescente e da família, tornando o ambiente mais caloroso e mantendo as capacidades afectivas, criativas e sociais num ambiente difícil e destabilizante, permitindo-lhes o desenvolvimento do imaginário através de actividades lúdicas e culturais, canalizando as emoções e atenuando as sequelas psicológicas. Se aceitarmos estes pressupostos, verificamos que nenhum profissional pode actuar sozinho e que nenhuma formação reúne todos estes conhecimentos.

O que nos remete para o seguinte: o quadro do hospital não devia contemplar profissionais com formações diversas (animadores socioculturais, educadores de infância e outros) ? Atendendo que nos estamos a relacionar com "uma planta - frágil e vulnerável... o afecto e o brincar desempenham um papel determinante e podem contribuir de forma decisiva para o bem estar físico e psíquico do doente e, portanto, para a sua melhoria". (Torrado da Silva)

A importância da Animação Sociocultural em contexto hospitalar

O tempo em que o hospital era uma instituição fechada pertence ao passado, mas não tão distante. Ainda há quem pense que a criança doente precisa de sossego, pelo que não deve ser incomodada. Esquecem-se de ouvir a opinião das crianças e dos pais. Está comprovado que a promoção de vivências que permitam à criança continuar a poder ser criança enquanto está no hospital vai contribuir para a diminuição dos efeitos do internamento, proporcionar uma melhor qualidade de vida e tornar o olhar sobre a criança no hospital mais humanizado.
Um hospital é uma instituição com inúmeras capacidades, com recursos humanos dotados de um potencial de criatividade que importa dinamizar para melhorar a vida da criança, tendo presente os direitos consignados na Carta da Criança Hospitalizada (EACH, 1988). Contribuir para o cumprimento das recomendações da Carta da Criança Hospitalizada é garantir o direito de Ser Criança mesmo quando está doente.
Para a criança, a permanência num hospital é uma experiência traumatizante, é uma ruptura com os seus hábitos e com o seu mundo habitual: a família, a escola e os amigos.
A hospitalização pode gerar sofrimento e angústias que a fragilizam e até pode dificultar o seu processo de tratamento. Os sentimentos de solidão de ruptura com a vida exterior, o medo da dor, a perda da independência e da autonomia, são elementos que podem tornar a vida no hospital triste e tensa.
Uma das formas de os minimizar é tornar o meio hospitalar mais amigável, é levar vida e proporcionar experiências diferentes à criança e à família que tornem a sua estadia menos dolorosa, é contribuir para um ambiente mais humanizado. Hoje, estão disponíveis diversos meios que podem amenizar a estadia da criança no hospital, como por exemplo: o apoio educacional, a visita dos amigos, a criação de momentos de quebra de rotina da vida diária com a introdução de vivências em que a criança possa esquecer o local onde está, e viver momentos de profundo bem -estar e satisfação. Isto quer dizer que os serviços devem estar centralizados na criança e nas suas necessidades. Brincar é uma actividade fundamental ao seu desenvolvimento mesmo quando doente, para além disso é um direito.
Como temos conhecimento, tem-se assistido nos últimos anos a um interesse crescente por parte da sociedade em intervir nestes locais, isto corresponde a uma maior consciencialização dos direitos das crianças e do seu papel.
A Animação Sociocultural nestes locais é muito importante, pois é necessário que existam intervenções programadas da responsabilidade de profissionais preparados para o meio hospitalar, que aprenderam o que é um hospital, o respeito pela criança e pela família, que sabem estar com os profissionais de saúde, que dialogam com eles com o intuito de contribuir para o bem - estar da criança e que principalmente têm vontade de aprender com os outros profissionais para que exista um trabalho de equipa e uma troca de saberes. Esta intervenção é sentida pela criança e família, e também pelos outros profissionais que, muitas vezes usufruem de momentos lúdicos, de paragem na sua actividade, que é frequentemente geradora de grande tensão. É necessário existir por parte dos serviços uma organização para que estas iniciativas possam ser conjugadas, articuladas e integradas na vida hospitalar, constituinda uma mais valia no apoio às crianças e às suas famílias.
Isto requer profissionais nas respectivas áreas da cultura e/ou Animação e não pessoas de boa vontade que gostem de animar crianças. É necessário garantir a continuidade e o profissionalismo.
"... Pôs-me numa rocha na maré vazia e o polvo, o caranguejo e o peixe tomaram conta de mim. O polvo arruma a casa, alisa a areia, vai buscar a comida... Mas o costureiro dos meus vestidos é o caranguejo... O peixe não faz nada porque não tem mãos, nem braços com tenazes como o caranguejo. Só tem barbatanas e as barbatanas só servem para nadar. Mas é o meu melhor amigo. Como não tem braços nunca me põe de castigo. É com ele que eu brinco. Quando a maré está vazia brincamos nas rochas, quando está alta damos passeios no fundo do mar..."
(Andersen, Sofhia de Mello Breyner)
O pequeno excerto acima transcrito evoca-nos, por mão de mestre da literatura infantil, as múltiplas áreas a que é necessário atender para a promoção adequada do crescimento e desenvolvimento da criança.